10 novembro 2017

SHADOWSIDE: "Shades of Humanity foi um álbum difícil de finalizar", revela Dani Nolden

Por Julio Feriato / Fotos: divulgação

Da esq. p/ dir.: Fabio Buitividas (bateria), Raphael Mattos (guitarra), Dani Nolden (vocal), Magnus Rosén (baixo)
Desde o lançamento de seu primeiro disco em 2005, o Shadowside vem lapidando seu caminho no cenário mundial do heavy metal a passos largos e com muita convicção sobre onde chegar. O divisor de águas na carreira do grupo talvez seja o excelente "Inner Monsters Out" (2011), gravado na Suécia com produção do renomado Fredrik Nordström, (conhecido por produzir bandas consagradas como Dimmu Borgir, In Flames, Dark Tranquility, Hammerfall e muitas outras) que trouxe uma sonoridade mais pesada, agressiva, além de uma produção infinitamente superior aos trabalhos anteriores. 

O resultado daquele disco agradou tanto que a banda voltou a trabalhar com ele em "Shades of Humanity", novo álbum lançado este ano e que contou com o baixista Magnus Rosén, conhecidíssimo por aqui por ter tocado no Hammerfall durante muitos anos. Conversei com a simpática vocalista Dani Nolden sobre esta nova fase do grupo, e o resultado você lê a seguir.


Capa de 'Shades of Humanity'
Dani, primeiramente parabéns pelo resultado alcançado em 'Shades of Humanity'! Agora que ele finalmente foi lançado, quais seus sentimentos em relação a este trabalho?
Obrigada, Julio! É difícil descrever a sensação de ver o “Shades of Humanity” lançado e bem recebido. Eu não sei te dizer qual é a sensação para os meninos da banda, mas pra mim, esse é o álbum mais especial da minha vida e da minha carreira. É sempre muito legal lançar um trabalho novo, mas eu fiquei encarregada de todas as letras dessa vez, e acabei criando um vínculo emocional muito grande com esse álbum. Além disso, tivemos muitas dificuldades pra conseguir finalizar o trabalho, principalmente por causa de problemas pessoais, que tornaram o lançamento do “Shades of Humanity” uma vitória e tanto. 

Todos nós tivemos dificuldades durante a composição do álbum, mas exemplificando apenas com a minha situação, eu lutei contra uma depressão durante muitos anos, sem nem saber que estava com depressão, e foi algo tão sério que eu passei a simplesmente não gostar mais de música... Nem sequer de ouvir música. Eu passei cerca de um ano sem ouvir uma nota musical de qualquer artista sequer. Então, quando finalmente consegui voltar a me interessar por música, a compor, a cantar e quando o álbum estava pronto, gravado, nas minhas mãos, eu desabei de chorar (risos). 

Foi um choro de alívio, de felicidade e de realização. Naquele momento, pensei: “não vai importar se ninguém gostar deste trabalho... É o álbum da minha vida”. E felizmente, parece que todos estão gostando muito, e, musicalmente, eu o considero nosso melhor trabalho até hoje!



Mais uma vez vocês trabalharam com o produtor sueco Fredrik Nordström. Além da produção, qual foi a participação dele na concepção deste disco, ele deu algum 'pitaco' nas composições?
Sim! O Fredrik e o Henrik produziram o álbum em parceria, mas o Henrik ficou encarregado mais da mixagem e o Fredrik da produção em si. Ele mexeu em muita coisa com a gente, inclusive tanto a melodia quanto a harmonia do refrão de “Insidious Me” foi composta por ele, pelo Raphael, nosso guitarrista, e por mim. Eu não estava satisfeita com o refrão que eu tinha feito originalmente, e, como sempre, nós decidimos que não nos conformaríamos com simplesmente terminar uma música. Tem que ser algo que nós realmente gostamos ou não gravamos. Então ficamos alguns dias debatendo, experimentando melodias, testando várias opções, até que encontramos o refrão da música. 

Ele sempre dá as opiniões dele de uma forma muito honesta e nós adoramos isso, porque ele é o nosso primeiro filtro. E também gostamos que ele respeita quando temos convicção de que algo realmente deve ficar daquele jeito, mesmo quando ele sugere algo diferente; é uma parceria muito saudável. Trabalhamos com outros produtores antes que não aceitavam quando nós discordávamos. Então, quando trabalhamos com o Fredrik pela primeira vez, nós chegamos lá aceitando tudo que ele dizia, até que ele disse pra nós: “ei, vocês não precisam aceitar tudo que eu falar. São só sugestões”. A partir daquele momento, a parceria passou a fluir de vez. A gente escuta e respeita demais a opinião dele, e ele respeita muito a nossa visão artística.

Show em Paris, França, em 2013
Você acha que deve existir algum limite artístico entre produtor e a banda?
Sim, acredito que sim. O produtor precisa ajudar a banda a extrair o seu máximo e chegar no que a banda quer chegar, sem mudar o direcionamento, a visão da banda. Ser produtor não é fácil, porque o produtor precisa entender o que a banda busca, saber orientar sem transformar tudo na mesma coisa. Eu não sei se eu seria capaz de fazer isso, de colocar meus gostos musicais de lado pra fazer uma banda chegar naquilo que ela se propõe a fazer, mesmo que seja algo que eu não curta. E tanto o Fredrik quanto o Henrik são caras que produzem várias coisas muito diferentes dentro do rock e do heavy metal, e nada soa parecido. Até os timbres de guitarra que eles tiram são diferentes de uma banda pra outra.

Penso que a banda precisa saber exatamente quem ela é musicalmente, e onde quer chegar, e o produtor precisa respeitar essa visão e auxiliar a banda a chegar lá. Por isso, é importantíssimo que banda e produtor se conheçam e conversem antes de começar a trabalhar, pra todo mundo ter certeza que está de acordo com o que vai ser feito, e como vai ser feito. Não existe um jeito errado de trabalhar, mas existem jeitos que funcionam pra alguns e não funcionam pra outros.

Revista japonesa  Burnn!!!
Achei que as músicas novas estão mais encorpadas, com riffs mais pesados e até um certo 'groove'. Essa era a ideia desde o inicio ou foi algo que surgiu naturalmente durante o período de composição?
Simplesmente surgiu, a gente não força a direção das composições. Que seria pesado, a gente já sabia, porque sempre achamos que dá pra ficar um pouquinho mais agressivo (risos). Mas o ‘groove’ foi surgindo naturalmente. O Raphael gosta muito de bandas com ‘groove’ e isso provavelmente acabou influenciando quando ele fez os riffs

A gravação foi bem interessante por conta disso, foi engraçado como o Magnus, que é sueco, não estava acostumado a gravar esse tipo de coisa, e os produtores não entendem algumas coisas que a gente faz, como as antecipadas que tanto eu quanto o Raphael gostamos de compor, e dizem “vamos confiar em vocês” (risos). Nós não temos influência direta da música brasileira, mas essa “brasilidade” está presente na nossa vida, não tem jeito de não influenciar de alguma forma. 

Nosso som não soa brasileiro, não parece ter influência da música nacional, mas de certa forma, tem. Por isso, por mais que a gente tenha uma sonoridade parecida com a das bandas suecas, tem um toque diferente, principalmente porque não tentamos copiar deles, nós só fazemos aquilo que vem na cabeça, e sai isso aí! (risos) 

Misturamos bastante os riffs pesados e agressivos com arranjos detalhados, tanto de guitarra quanto de teclado, com bastante melodia. Nós queríamos mesmo que tudo soasse bem encorpado e orgânico, com aquela energia do som ao vivo.


O primeiro single foi 'Alive'. Qual o critério usado para escolher esta música como a primeira a representar "Shades of Humanity"?
Na verdade, quem escolheu a música foi o diretor do videoclipe, o Daniel Stilling. Desde o começo, todo mundo gostou bastante de “Alive”, tanto nós da banda quanto os produtores e pessoas que chegaram a ouvir antes de lançarmos o trabalho, mas as pessoas também gostavam bastante de “The Fall”, “Beast Inside”, “What If” e “Drifter”. Então, deixamos que o Daniel escolhesse, porque como ele iria fazer o roteiro do videoclipe, pensamos que ele deveria escolher a música que mais o inspirasse, e ele escolheu “Alive”. 

Acabou se tornando um curta-metragem de quase 10 minutos, com várias histórias de sobrevivência e uma fotografia incrível, o que não é surpresa, afinal o Daniel já trabalhou em superproduções, como o filme “Perdido em Marte” e o seriado “Criminal Minds”. 

Com o diretor Daniel Stilling
Vocês planejam gravar outros videoclipes? Acho que um para "The Fall" seria perfeito!
Eu adoraria! O Dan está falando que quer filmar mais, o problema é a gente ir para os Estados Unidos de novo, o bolso não aguenta (risos). E mesmo um videoclipe mais simples, filmado aqui, no momento é inviável. Mas temos planos, sim. Assim que possível!

Como está o entrosamento com o baixista Magnus Rosén?
Não poderia estar melhor, ele é a peça que estava faltando na Shadowside. Ele pensa exatamente como a gente, ou seja: ele pensa diferente, e fala exatamente o que está pensando, porque é sempre para o bem da banda! Eu sinto que o que torna a Shadowside especial é justamente o fato de a gente conciliar quatro opiniões, gostos e históricos completamente diferentes, até que todos estejam satisfeitos. Não vou mentir e dizer que isso é fácil, porque não é. É um dos motivos de vários baixistas não terem ficado na banda. 

Eu, o Fabio e o Raphael temos esse método de trabalhar desde 2007, e sabemos que nem todo mundo se adapta a ele. Dificilmente nós fazemos elogios entre nós mesmos, porque não vemos sentido em fazer isso. Não adianta eu falar pro Fabio que ele está tocando muito, ou o Raphael falar pra mim que eu estou cantando demais, se os fãs não concordarem com isso. Não somos nós que temos que fazer os elogios! Tem que haver criticas entre nós mesmos, do contrário, não vamos crescer. 

E não é fácil você trabalhar durante um mês em uma música e ouvir que ela não está legal, só que nós sempre temos em mente que isso é pelo bem da banda. Se não está legal, vamos trabalhar pra ficar legal. E o Magnus veio exatamente com esse pensamento, ele fala de forma respeitosa, mas fala o que precisa falar, assim como a gente fala pra ele, e o entrosamento foi simplesmente maravilhoso. 

Ele foi ao estúdio várias vezes só pra ver como tudo estava ficando, mesmo depois de terminar de gravar. Está sempre interessado, sempre orgulhoso de estar na banda. É o músico mais experiente que já passou pelo Shadowside, é um cara que já tem discos de ouro, já foi indicado ao Grammy, e é o baixista que mais “vestiu a camisa” da banda até hoje. 

Não significa que os baixistas que tocaram conosco antes não tenham se esforçado ou “vestido a camisa”, mas o Magnus veio pra banda com uma “garra” que eu nunca tinha visto antes.


Em uma outra entrevista você me confirmou que ele é baixista definitivo e não gravou apenas como contratado. Já que ele mora na Suécia e o restante no Brasil, como está o planejamento para gerenciar a agenda de vocês, visto que geograficamente estão todos bem longe?
Nós sempre tivemos a necessidade de coordenar a agenda, porque viajar pra fora de São Paulo pra fazer só um show sempre fica inviável, já que viajar dentro do nosso próprio país é caro. Então não muda muita coisa. 

Lá na Europa, já fazemos sequências de shows de qualquer forma, então a única diferença é que provavelmente vamos ter que ir uma semana antes pra fazer alguns ensaios, e vai ser da mesma forma aqui no Brasil, vamos armar uma sequência e ele vai chegar uma semana antes pra ensaiarmos. Ele só não vai tocar com a gente se já tiver compromisso agendado e não puder desmarcar, mas isso já aconteceu até com o Fabio, o nosso baterista, que não tocou com a gente em Manaus porque ele é produtor da Fafá de Belém e infelizmente não conseguiu um substituto naquela data. 

Como a Shadowside não é nosso sustento, não dá pra forçarmos todo mundo a abandonar outros trabalhos. Mas fora situações extremas assim, o Magnus estará conosco em todos os shows!

Uma característica que sempre admirei na Shadowside é o profissionalismo, com trabalhos bem produzidos, músicas incríveis, shows impecáveis, ou seja, vocês tem todos os requisitos para cair no gosto do público. No entanto, vejo que pelo menos no Brasil, a grande massa ainda não dá à vocês o devido valor que merecem e preferem sempre idolatrar os ídolos já conhecidos. Qual a sua visão à respeito disso?
Acho que o grande problema é que a grande massa simplesmente não conhece mais do que os grandes ídolos. Existem poucos espaços na grande mídia disponíveis para artistas que não sejam os já consagrados há muito tempo, demora muito aqui no Brasil para que uma banda conquiste o respeito ou a atenção de uma parcela da mídia não especializada, e infelizmente, sem esse espaço, as bandas mais novas simplesmente não vão chegar ao mesmo patamar que as mais antigas.

Parte do problema é que as pessoas que não conhecem heavy metal simplesmente não levam o estilo a sério, e por conta disso, o público os rejeita, então quando uma banda finalmente consegue espaço em um tipo de mídia mais "comum", muitos fãs acabam ficando ofendidos, dizendo que a banda se vendeu, que virou "modinha".

É compreensível que exista essa rejeição por parte do público de heavy metal com relação a algo que se torna popular, porque é um meio que sempre rejeitou o metal, e de repente alguém que sempre amou o estilo vai ser rotulado da mesma maneira que alguém que só passou a ouvir porque apareceu na TV, mas não acho que exista outra solução para que o público se renove. 

O heavy metal é forte em países na Finlândia porque o estilo lá é muito difundido. Aqui, percebo que tem muita gente que gosta de heavy metal, mas não conhece mais do que o Iron Maiden ou o Metallica... Alguns os chamariam de "posers", mas precisamos entender que nem todo mundo é tão envolvido com o estilo de vida heavy metal, e simplesmente gosta de um bom som, mas não corre atrás de outras bandas. 

Então, não me sinto desvalorizada como cantora ou como banda, pois grande parte do público não conhece grande parte das excelentes bandas brasileiras que temos, e o único jeito de mudar isso é aumentando a visibilidade do heavy metal como um todo. Uma grande prova disso é a quantidade enorme de fãs que nós conquistamos, especialmente no início da carreira, em Santos, porque distribuíamos panfletos na porta das escolas, para pessoas que não estavam normalmente nos shows de metal da cidade. Eram adolescentes que curtiam heavy metal, mas nem sabiam da existência de bandas de metal na cidade.

A divulgação underground simplesmente não chega em muita gente que queria saber daqueles eventos e bandas. O público não se renova porque não existe mais essa divulgação em massa do heavy metal, então as crianças e adolescentes nem chegam a conhecer heavy metal enquanto ainda estão formando seu gosto musical... Eu tive acesso ao Guns n' Roses quando tinha 11 anos de idade por causa da MTV, que dedicava um belo espaço ao rock naquela época. Então, infelizmente, nada disso vai mudar enquanto não voltarmos a espalhar heavy metal por aí. 

Não é culpa de ninguém, mas temos que voltar a mostrar a força e a voz que os fãs de metal têm, e começar a pedir a presença das bandas em festivais de música que reúnam vários estilos diferentes, em rádios, em programas de tv... não só das bandas brasileiras, mas de qualquer banda de heavy metal que esteja longe dos olhos da grande massa.

Show em Bucharest, Romênia
Esse compromisso e profissionalismo que mencionei acima é algo que infelizmente falta na grande maioria das bandas brasileiras e eu sei que muitas delas sentem uma certa dor de cotovelo por vocês já terem feito turnês grandes no exterior e por sempre exigir o mínimo de profissionalismo dos produtores nos shows daqui. Você acha que esse tipo de atitude é uma das coisas que mais atrapalham o crescimento de nossa cena?
Sem sombra de dúvida. Sobre a dor de cotovelo, eu não sei se ela existe, mas se existir, penso que isso não chega a atrapalhar alguma coisa. Mas com relação ao profissionalismo, o que algumas bandas ainda não entendem é que quando lutamos por melhores condições de shows, todas as bandas se beneficiam com isso. Se todas as bandas fizerem isso, os espetáculos brasileiros seriam tão bons ou melhores que os estrangeiros, porque não falta banda boa no metal brasileiro.

Uma das coisas mais importantes pra nós é a pontualidade e organização de horários dos shows, que beneficia o público e as bandas, porque evita cortes de horário, faz com que a última banda não seja obrigada a tocar às 5h da manhã, e permite que as bandas façam vários shows seguidos. Quando tocamos em Belém/PA em 2012, nós fizemos o show e já fomos direto para o aeroporto, porque tínhamos outro show no dia seguinte, em outro estado. Com essa “cultura do atraso”, esse tipo de coisa fica difícil de fazer, e não conseguimos implementar a rotina de turnês aqui no Brasil como existe na Europa.

Existe um motivo pra tudo que pedimos nos nossos shows, seja pra manter a qualidade do som, seja pra agilizar a troca de palco entre as bandas. Não pedimos nada por estrelismo. Cada banda tem que saber aquilo que ela precisa pra tocar, sem se incomodar ou querer mandar nas condições que as outras bandas pedem ou recebem. Tudo aquilo que nós sentimos que pode nos prejudicar está combinado em contrato. Todas as bandas deveriam fazer o mesmo, assim o produtor tem condições de saber o que ele pode e deve coordenar. E se ele não coordenar, todas as bandas podem e devem lutar para que as condições que elas combinaram sejam cumpridas. 

Quando as bandas se unem, pode ter certeza que se encontra um jeito de ficar bom pra todo mundo. O problema é que é mais fácil brigar com a banda que está exigindo que tudo seja cumprido corretamente do que brigar com o produtor que vai te levar pra tocar lá de novo.

Agora que o disco foi lançado, quais os planos futuros?
Cair na estrada! Queremos tocar o máximo que pudermos. O Raphael e o Magnus andam conversando muito sobre o que eles vão fazer nos shows... estamos ansiosos pra tocar as músicas do “Shades of Humanity” ao vivo!

Deixe um recado aos fãs da banda e leitores do blog!
Muito obrigada pelo apoio e por terem tido tanta paciência com a banda enquanto preparávamos o lançamento do “Shades of Humanity”. Espero que curtam, é o álbum mais espontâneo da nossa carreira, nós vamos tocá-lo ao vivo com uma energia enorme! Nos vemos em breve!

Discografia:
Shadowside (EP 2001); Theatre of Shadows (2005); Dare to Dream (2009)Inner Monster Out (2011); Shades of Humanity (2017)


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